06 outubro 2006

Metro



Ela era tudo.
De lenço no pescoço, ombros à mostra e calções curtos, ocultava o olhar com óculos escuros que mantinham o mistério da direcção do seu olhar.
Os longos cabelos cor de breu contrastavam com o branco cuidado das unhas, numa combinação fatal.
Homem ou mulher, ninguém a ousava olhar de frente. Porém, todos sabíamos que não havia ninguém na carruagem que não estivesse a observar todo e qualquer contorno seu.
Neste estado de embriaguez colectiva, ninguém sabia muito bem onde estávamos quando o assobio mecânico anunciou a chegada à estação e ela saiu.
Percebendo a custo quão fugaz é um vislumbre da perfeição, todos tentámos reagir como se a realidade não fosse um fardo. Ao fundo, um padre voltou a calcular mentalmente o que faria quando fosse acusado de pedofilia, enquanto que um idiota mesmo atrás de mim se lembrou de tentar impressionar a amiga com detalhes sobre a mordida da cobra que havia comprado no mercado negro.
Junto a mim, uma mulher tentou ler o que escrevia. Subitamente desviou o olhar, não sei se por se ter apercebido que outra mulher a deixara tão atraída, ou pelo facto de eu o ter gravado para a posteridade nestas frases.

2 comentários:

Anónimo disse...

Abraço Amigo!!

Poderias fazer uma enciclopédia só com histórias do metro amigo!!!

ND disse...

Curioso teres dito isso...